O Cravo de Abril

De um molho de cravos destinados ào aniversário do restaurante, a 25 de abril, com tudo fexhado, a Celeste, empregada da limpeza do restaurante distribuiu cravos pelos soldados e deu um ao capitão Salgueiro Maia.

A sementinha estava enterrada na terra escura e fria. Não estava sozinha, mas isso ela ignorava. Esperava o sol brilhar e a chuva cair, para poder brotar e crescer. Queria ver o mundo que as raízes das árvores diziam ser maravilhoso, colorido, cheio de texturas diferentes e de uns seres estranhos, os humanos, que, ultimamente, andavam a dar cabo da Terra. Com determinação, a semente cresceu e viu a luz do sol. Era um dia de abril chuvoso e frio. Transformou-se numa linda flor cheia de cor e de amor para dar. Era vermelha, mas havia de outras cores.


O jardineiro chamou-lhe cravo e vivia numa estufa de flores iguais a ele e outras iguais mas de cores diferentes e outras ainda, das quais desconhecia o nome, no horto, onde eram plantadas para depois partirem para outras lados, para serem vendidos ou plantados nos jardins da cidade.


Ele era forte, resistente e muito bonito, com as suas pétalas vermelhas e pontiagudas. E um grande monte foi salvaguardado para servirem de decoração para uma festa.

No dia 25 de abril, a Dª Celeste dirigia-se para o restaurante, onde trabalhava na limpeza e no serviço, quando viu muito movimento nas ruas e soldados a passarem e a gritarem com toda a alma «o povo unido jamais será vencido».


Não percebia nada de política, mas apercebeu-se de que tudo estava fechado e os cravos que se destinavam para a festa do restaurante, que fazia um ano de existência e que estavam destinados a serem oferecidos aos clientes que ali fossem nesse dia, estavam aos molhos à porta do restaurante. O patrão disse-lhes que levassem as flores para casa, para não ficarem ali a apodrecer.


Celeste ainda perguntou aos soldados que iam nas “chaimites” o que estava a acontecer. Percebeu a alegria das pessoas, recebeu um jornal que, nesse dia, saiu sem ser censurado e sentia uma espécie de eletricidade que lhe percorria o corpo. Estava eufórica, sem saber porquê. Talvez tivesse origem no julgamento de um tio a que assistira e que a marcou para a vida.


Um soldado pediu-lhe um cigarro, mas ela não tinha. Então ofereceu-lhe um cravo que ele enfiou na espingarda. O gesto foi sendo repetido por todos os soldados à medida que a Celeste lhos entregava e as floristas seguiram-lhe o exemplo. Pegaram nos cravos e entregavam-nos aos soldados que passavam e os metiam nas G-3. Uma revolução em que não se disparavam tiros, mas se usavam cravos.


Era quase como se o cravo tivesse decidido tomar as rédeas e dizer «Basta!», chegou a hora de lutar. Que deixassem de pisotear as pessoas, de as massacrar e que a ditadura acabasse e todos pudessem viver em liberdade. Foi assim que o regime autoritário do Estado Novo de 48 anos foi derrubado e se iniciou um período de transição para a democracia.


E o nome da Revolução dos Cravos veio daí, do facto dos militares, que lideraram a revolução, colocarem os cravos vermelhos que lhes ofereciam nos canos das suas armas, passando a simbolizar a libertação do povo português, a conquista da liberdade e da democracia.


Esta flor, conhecida por representar o amor e a paixão, acabou por ter um significado muito particular para o povo português, a liberdade. A revolução saiu vitoriosa e o cravo tornou-se o símbolo dessa luta, representando a coragem e a determinação de um povo em busca dos seus direitos e da sua liberdade, tornando-se inseparáveis, lembrando a todos que é preciso lutar por aquilo em que se acredita, mesmo que as adversidades sejam grandes.


Todos têm, pois, a obrigação de florescer, de espalhar a luz por onde puderem e, durante a sua jornada, o seu crescimento e transformação, aceitarem que todos têm de ser ouvidos e ninguém tem o direito de impor a sua vontade. Há que enfrentar os desafios sem ferir os outros. A liberdade de cada um acaba onde começa a do outro.

Só assim o país poderá florescer todos em paz e harmonia e continuar a ser este cantinho à beira-mar plantado.


Quanto ao pequeno cravo teve a honra de ser entregue ao capitão Salgueiro Maia, que o colocou na lapela.

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Maria Teresa Portal Oliveira

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