Naquele dia, no Lago Azul, estavam todos excitados. A ninhada da Dª Pata nascera- Todos os ovos tinham sido chocados e os patinhos tinham saídos das suas pequenas prisões com sucesso, mesmo aquele mais pequenino que necessitara da ajuda da Dª Pata.
Quanto ao progenitor, o mais belo pato bravo do bando espanejava as suas penas e mostrava a sua bela plumagem, cabeça verde com um halo branco, asas castanho arroxeadas, as asas de um cinzento acastanhado e o abdómen cinza páiido. e . Dª Pata tinha a plumagem castanha salpicada das fêmeas.
Ao grasnar do bando dos patos bravos, juntava-se o coaxar das rãs, o chilrear e pipilar dos passarinhos, o palrar das pegas, o crocitar dos corvos, o cucar dos cucos, o piar das corujas, o guinchar dos ratos… até o regougar da raposa. Também ela fora mãe, há pouco tempo, e via o número de possíveis presas a aumentar. Tinha de alimentar as crias.
Até os peixes estavam felizes, embora festejassem a uma distância razoável, não se fossem tornar em alimento de toda aquela gente trajada de penas e penugens.
Uma grande revoada de patos bravos elevou-se nos céus azuis primaveris e espalhou a notícia.
E a ninhada foi alimentada pelos pais carinhosamente. A qualquer momento, corriam a abrigar-se sob as asas protetoras de DªPata. Cedo um começou a tentar impor-se aos irmãos. Era o mais forte e também o mais esperto. E, caso nunca visto, tinha uma penugem negra.
No Lago Azul, ficou logo com a alcunha de Pato Negro. Era cioso dos cuidados da mãe, exigindo constantemente a sua atenção e afastando-a dos irmãos, sempre que podia. Era egoísta. Tinha ciúmes dos irmãos. Não a deixava em paz e Dª Pata desdobrava-se para dar assistência aos filhotes. E havia um, o mais pequenino, que precisava tanto de cuidados! Até para sair das casquinhas do ovo tinha tido auxílio!
Quando andavam a aprender a nadar, o pequenote quase se afogava. Era tão leve, tão frágil! E mergulhar foi uma dificuldade acrescentada. Tinha problemas em vir à tona. Só a mãe pata o puxava.
─ Qua, qua, qua ─ protestava o Pato Negro.
E procurava mesmo dar bicadas no pequenino que se encolhia todo.
O tempo foi passando e a ninhada de patos bravos foi ganhando a bela plumagem dos machos ou a mais discreta das fêmeas. Dos seis, só havia uma fêmea.
E o Pato Negro, apesar do seu feitio quezilento e egocêntrico, era o mais belo dos irmão e adquiriu uma bela plumagem em diversos tons de cinza arroxeados e a bela cabeça verde.
Ninguém gostava dele no Lago.
─ Que mau feitio! ─ resmungavam uns.
─ Ninguém o atura! ─ quaquejavam outros.
O patinho olhava-os de lado e apenas lhes lançava um «Qua, qua» desdenhoso.
Ora… Um dia… Sim, há sempre um dia…
Um certo dia de verão, a mãe pata saiu com a sua ninhada para um passeio mais prolongado pelo Lago Azul.
Naquele dia, o lago espelhava o arvoredo que o rodeava, tão límpidas eram as suas águas.
O Pato Negro tinha um outro defeito. Era muito curioso. Ouviu um barulho no meio do canavial e foi ver o que se passava. A mãe pata não deu conta. O único que se apercebeu foi o Pequenino. Seguia na cauda, como de costume, já que não nadava tão rápido como os outros, viu o irmão a sair da fila e estranhou não o ver regressar.
Nadou o mais rápido que pôde e ainda viu o irmão a mergulhar. Era um exibicionista. Não admirava. Mas não regressava.
Começou a grasnar os seus quas o mais alto possível. Ninguém podia acudir a tempo. Então foi ele. Mergulhou e viu que a raiz de uma das canas se tinha enrolado à volta das patas do irmão impedindo-o de voltar à tona.
Que fazer? Ainda o tentou libertar. Não conseguiu. Ele não tinha força e o irmão ia morrer afogado. Então, escolheu uma cana e levou-a ao irmão para ele poder respirar.
Desesperado, regressou à superfície e pôs-se a grasnar aflitivamente.
─ Qua, qua, qua…
Eram quas aflitivos. Conseguiria o seu intento? Salvar o irmão?
Ficou mais calmo, quando viu a mãe a nadar furiosamente na sua direção. Entretanto, também outros patos o ouviram e vieram ver o que acontecia.
Ao contrário do Pato Negro, o Pequenino era admirado e amado por todo o bando.
E foi um esforço comum que conseguiu libertar o patinho.
«A união faz a força». É verdadeiro o ditado.
Ainda ofegante, o patinho sentiu-se envergonhado e mal com a atenção que recebia. Nunca tinha tratado bem nenhum dos patos que lhe prestavam socorro agora.
Estava arrependido.
Dali em diante, o Pato Negro teve um comportamento completamente diferente. E, como já tinha desenvolvido uma bela plumagem cinza arroxeada e com várias tonalidades de cinzento, começaram a chamar-lhe Pato Cinzento.
E não admira que, mais tarde, ele se tornasse o chefe do bando.
A partir daquele dia, quem vê uma graciosa revoada no céu sabe que por trás daquela disposição aparentemente aleatória, está a liderança do Pato Cinzento. O seu papel é essencial para todos saberem que rumo tomar. E sabe ceder a frente do bando, quando está fatigado, revezando a dianteira com o pato que lhe esrá imediatamente atrás, permitindo que o bando tenha mais resistência para viagens longas e difíceis, e ainda aproveitem o impulso gerado pelo deslocamento de ar do pássaro que voa à frente. Aprendeu que a formação em V também melhora a comunicação e a coordenação do bando. Sozinhos, cada um por si, demorariam mais tempo e chegar ao seu destino, seria uma tarefa muito mais árdua.
Nunca mais pensou em EU e passou a valorizar o NÓS. E aprendeu também que os irmãos são uma dádiva maravilhosa, porque existem laços afetivos que são entrelaçados para toda a vida. Na hora H, os irmãos cerram fileiras e apoiam-se uns aos outros.
E o Pato Cinzento transformou-se no orgulho do seu bando.
E vitória, vitória, acabou a história.
Maria Teresa Portal Oliveira
© 2021 | Maria Teresa Portal Oliveira I Política de Privacidade I Termos & Condições